No universo das cobranças judiciais, um dos maiores temores de um credor é ver o devedor se desfazer de seu patrimônio para não pagar o que deve. Quando essa manobra ocorre com um processo já em andamento, ela recebe um nome específico e um tratamento rigoroso pela lei: fraude à execução.

Entender esse conceito é fundamental tanto para quem cobra (credor) quanto para quem compra bens de alguém que pode estar endividado.

O Que Caracteriza a Fraude à Execução?

A fraude à execução não é qualquer venda de bens feita por um devedor. Para ser configurada, a lei exige a presença de alguns requisitos claros, conforme o Artigo 792 do Código de Processo Civil:

 

    1. Existência de um Processo: É o ponto principal. A fraude só ocorre quando já existe uma ação judicial (de cobrança ou execução) correndo contra o devedor. Antes disso, a venda de bens pode configurar outro tipo de fraude (fraude contra credores), que é mais difícil de provar.

    1. Venda ou Oneração do Bem: O devedor vende, doa ou dá em garantia um bem que poderia ser usado para quitar a dívida.

    1. Insolvência do Devedor: A venda do bem deve levar o devedor à insolvência, ou seja, ele fica sem patrimônio suficiente para arcar com a dívida. Se o devedor vende um carro, mas ainda possui um imóvel de valor superior ao débito, não há fraude à execução.

    1. Ciência da Fraude (Má-fé): Aqui está o pulo do gato. A lei presume a má-fé em certas situações, tornando a vida do devedor e do terceiro (comprador) muito mais difícil. A fraude é evidente quando:

       

        • A existência do processo já foi averbada (anotada) no registro do bem (por exemplo, na matrícula de um imóvel ou no documento de um veículo).

        • Já existia uma penhora registrada sobre o bem.

        • O comprador tinha provas ou conhecimento da existência do processo capaz de levar o vendedor à insolvência.

Em resumo: se o processo já é público e o devedor vende o único bem que tinha, a fraude está praticamente configurada.

Quais as Consequências?

As consequências são severas e visam proteger o direito do credor e a seriedade do sistema judiciário.

 

    • Para o Credor: A venda é considerada ineficaz. Isso não significa que a venda é anulada, mas sim que, para o credor daquele processo, ela é ignorada. O credor pode pedir a penhora do bem como se ele ainda pertencesse ao devedor, mesmo que já esteja em nome do comprador.

    • Para o Terceiro (Comprador): É a situação mais delicada. O comprador de boa-fé que não pesquisou a situação do vendedor pode perder o bem para o credor. Depois disso, ele terá que entrar com uma ação de regresso contra o devedor para tentar reaver o dinheiro que pagou.

    • Para o Devedor: Além de não conseguir proteger seu patrimônio, o devedor que comete fraude à execução pode ser multado por ato atentatório à dignidade da justiça, com valor que pode chegar a 20% do valor da causa.

Como o Credor Pode se Proteger?

A melhor proteção é a prevenção. Assim que o credor ingressa com a ação, ele deve solicitar ao juiz a averbação premonitória: uma anotação nos registros de imóveis, veículos e outros bens do devedor sobre a existência daquele processo.

Essa simples anotação torna a existência da dívida pública e impede que qualquer comprador futuro alegue desconhecimento, garantindo a eficácia da futura execução.

Por: Victor Nicoletti

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