
No universo das cobranças judiciais, um dos maiores temores de um credor é ver o devedor se desfazer de seu patrimônio para não pagar o que deve. Quando essa manobra ocorre com um processo já em andamento, ela recebe um nome específico e um tratamento rigoroso pela lei: fraude à execução.
Entender esse conceito é fundamental tanto para quem cobra (credor) quanto para quem compra bens de alguém que pode estar endividado.
O Que Caracteriza a Fraude à Execução?
A fraude à execução não é qualquer venda de bens feita por um devedor. Para ser configurada, a lei exige a presença de alguns requisitos claros, conforme o Artigo 792 do Código de Processo Civil:
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- Existência de um Processo: É o ponto principal. A fraude só ocorre quando já existe uma ação judicial (de cobrança ou execução) correndo contra o devedor. Antes disso, a venda de bens pode configurar outro tipo de fraude (fraude contra credores), que é mais difícil de provar.
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- Venda ou Oneração do Bem: O devedor vende, doa ou dá em garantia um bem que poderia ser usado para quitar a dívida.
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- Insolvência do Devedor: A venda do bem deve levar o devedor à insolvência, ou seja, ele fica sem patrimônio suficiente para arcar com a dívida. Se o devedor vende um carro, mas ainda possui um imóvel de valor superior ao débito, não há fraude à execução.
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- Ciência da Fraude (Má-fé): Aqui está o pulo do gato. A lei presume a má-fé em certas situações, tornando a vida do devedor e do terceiro (comprador) muito mais difícil. A fraude é evidente quando:
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- A existência do processo já foi averbada (anotada) no registro do bem (por exemplo, na matrícula de um imóvel ou no documento de um veículo).
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- Já existia uma penhora registrada sobre o bem.
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- O comprador tinha provas ou conhecimento da existência do processo capaz de levar o vendedor à insolvência.
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- Ciência da Fraude (Má-fé): Aqui está o pulo do gato. A lei presume a má-fé em certas situações, tornando a vida do devedor e do terceiro (comprador) muito mais difícil. A fraude é evidente quando:
Em resumo: se o processo já é público e o devedor vende o único bem que tinha, a fraude está praticamente configurada.
Quais as Consequências?
As consequências são severas e visam proteger o direito do credor e a seriedade do sistema judiciário.
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- Para o Credor: A venda é considerada ineficaz. Isso não significa que a venda é anulada, mas sim que, para o credor daquele processo, ela é ignorada. O credor pode pedir a penhora do bem como se ele ainda pertencesse ao devedor, mesmo que já esteja em nome do comprador.
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- Para o Terceiro (Comprador): É a situação mais delicada. O comprador de boa-fé que não pesquisou a situação do vendedor pode perder o bem para o credor. Depois disso, ele terá que entrar com uma ação de regresso contra o devedor para tentar reaver o dinheiro que pagou.
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- Para o Devedor: Além de não conseguir proteger seu patrimônio, o devedor que comete fraude à execução pode ser multado por ato atentatório à dignidade da justiça, com valor que pode chegar a 20% do valor da causa.
Como o Credor Pode se Proteger?
A melhor proteção é a prevenção. Assim que o credor ingressa com a ação, ele deve solicitar ao juiz a averbação premonitória: uma anotação nos registros de imóveis, veículos e outros bens do devedor sobre a existência daquele processo.
Essa simples anotação torna a existência da dívida pública e impede que qualquer comprador futuro alegue desconhecimento, garantindo a eficácia da futura execução.
Por: Victor Nicoletti